Utilização das técnicas de Debunking e Fact-checking no combate à desinformação: uma revisão integrativa
Use of Debunking and Fact-Checking Techniques to Combat Disinformation: An Integrative Review
Uso de técnicas de Debunking y Fact-checking para combatir la desinformación: una revisión integradora
Aprobado: 04/11/2024
Este artículo ha sido aprobado por la editora, Dra. Susana Graciela Pérez Barrera
Cauê Elias Santos Nascimento[1]
David Tavares de Sousa[2]
Gabriel Lucas Santana[3]
Ariane de Brito[4]
Resumo
Com o advento da globalização, é possível disseminar informações que são facilmente alcançadas pelos indivíduos devido à facilidade do acesso. No entanto, com estas, as notícias falsas estão integradas e podem ocasionar um ruído informacional. A partir disso, em contextos que são propensos à rápida difusão de informações, como observado na pandemia do COVID-19, foi necessária a atenção voltada a como se blindar do que é verossímil ou não. Com isso, o objetivo deste estudo foi investigar como a aplicação das técnicas debunking e fact-checking estão sendo utilizadas no combate de notícias falsas no mundo. Para tanto, foi realizada uma revisão integrativa através de buscas nas bases de dados SAGE, Science Direct e Periódicos Capes. Como resultados, as técnicas debunking e fact-checking mostraram-se promissoras para o combate à desinformação, sendo responsáveis pela melhoria na percepção de indivíduos que as utilizaram frente às notícias falsas. Ademais, é necessária uma ampla visualização do contexto em que estas serão utilizadas, como também uma maior produção científica que possibilite visualizar resultados que venham a corroborar o seu uso.
Palavras-chave: debunking, fact-checking, notícias falsas, desinformação, sociedade.
Abstract
With the advent of globalization, it is possible to disseminate information that is easily accessible to individuals. However, with this, fake news is integrated and can cause informational noise. Therefore, in contexts that are prone to the rapid spread of information, as observed in the COVID-19 pandemic, it was necessary to pay attention to how to shield oneself from what is credible or not. The aim of this study was to investigate how debunking and fact-checking techniques are being used to combat fake news around the world. To this end, an integrative review was carried out by searching the SAGE, Science Direct and Periódicos Capes databases. The results showed that debunking and fact-checking techniques were promising for combating disinformation, and were responsible for improving the perception of individuals who used them in the face of fake news. Furthermore, there is a need for a broad view of the context in which they will be used, as well as greater scientific production that will make it possible to visualize results that will corroborate their use.
Keywords: debunking, fact-checking, fake news, disinformation, society.
Resumen
Con la llegada de la globalización, es posible difundir información de fácil acceso para las personas. Sin embargo, con ello se integran las “fake news”, que pueden provocar ruido informativo. Por lo tanto, en contextos propensos a la rápida propagación de la información, como se observó en la pandemia COVID-19, era necesario prestar atención a cómo protegerse de lo que es creíble o no. El objetivo de este estudio era investigar cómo se están utilizando las técnicas de debunking y fact-checking para combatir las fake news en todo el mundo. Para ello, se realizó una revisión integradora mediante búsquedas en las bases de datos SAGE, Science Direct y Periódicos Capes. Como resultado, las técnicas de debunking y fact-checking resultaron prometedoras para combatir la desinformación, y fueron responsables de mejorar la percepción de los individuos que las utilizaron frente a las fake news. Además, es necesaria una amplia visualización del contexto en el que se utilizarán, así como una mayor producción científica para visualizar resultados que corroboren su uso.
Palabras clave: debunking, fact-checking, noticias falsas, desinformación, sociedad.
Introdução
No contexto brasileiro, desinformação é um conceito guarda-chuva que traz uma amplitude de significados, além de diversas formas de utilização, como para definir a ausência de informação, ruído informacional e informação manipulada (Pinheiro & Brito, 2015). Já no cenário internacional, tem-se uma categorização referente à intencionalidade do emissor, isto é, de acordo com Lewandowski et al. (2020), o termo “misinformation” refere-se a informações falsas, disseminadas independentemente da intenção, enquanto que “disinformation” refere-se a informações falsas disseminadas com a intenção deliberada de enganar a audiência. Ainda, tem-se o termo “fake-news”, que é mais popular, apresentando-se como um tipo de desinformação em formato jornalístico (Lazer et al., 2018).
A partir do grande evento mundial que foi a pandemia do COVID-19, houve uma mudança estrutural na quantidade do consumo de mídias digitais e, com isso, o cenário acadêmico voltou-se, urgentemente, a esse fenômeno, mediante à realização de pesquisas científicas que pleitearam a observação e a análise da sua progressão, juntamente com a propagação de informações falsas no ambiente digital (Fuchs, 2021; Oliveira et al., 2023; Nguyen et al., 2020; Tsfati et al., 2020); contexto este que ficou reconhecido como um cenário de Infodemia (Zielinski, 2021). A partir disto, sabe-se que a desinformação descontrolada traz sérios impactos psicossociais, sendo eles a alteração de percepções e crenças individuais e influências negativas sobre comportamentos e tomada de decisões, que repercutem desfavoravelmente a vida individual e comunitária (Islam et al., 2020).
Essas repercussões são refletidas em questões de saúde mental, por meio de desequilíbrios emocionais e impactos no bem-estar emocional, os quais podem desencadear quadros patológicos de ansiedade e síndrome do pânico (Rocha et al., 2021). Ainda a nível individual, observa-se correlações entre indivíduos que acreditam mais fortemente em notícias falsas com a redução do pensamento analítico, resultado este, encontrado em participantes com alto grau de fundamentalismo e dogmatismo religioso, que apresentam baixo grau de pensamento analítico (Bronstein et al., 2021).
Considerando-se os impactos individuais supracitados, também deve-se considerar os mecanismos psicofisiológicos que facilitam a crença na veracidade de informações falsas como a Inferência Espontânea Baseada em Traços (Levordashka & Utz, 2017) e vieses cognitivos como o viés de confirmação (Pennycook & Rand, 2021). Todos estes mecanismos oferecem suporte para as consequências coletivas da propagação desenfreada da desinformação, que vão desde abalos nas entidades democráticas até no processo eleitoral, causando prejuízos à coesão social e confiança nas instituições (Toff et al., 2021), além de fomentar a polarização e divisões sociais (Suhay, 2015). Haja vista a importância individual e coletiva de combate a desinformação durante a infodemia, algumas propostas de cunho informacional e jornalístico para mitigar a crença e propagação de informações falsas como o debunking e fact-checking rapidamente ficaram em evidência (Siwakoti et al., 2021).
De acordo com Uscinski et al. (2013), fact-checking ou “checagem de fatos” na tradução literal, é a ação de verificar informações que não são fatos e não podem ser declaradas como verdadeiras ou falsas inicialmente. Para uma definição mais categórica, o fact-checking é uma prática de verificação da veracidade de afirmações utilizando métodos rigorosos de pesquisa e análise de dados feitas por entidades públicas visando fornecer ao público informações precisas e confiáveis, destacando erros ou distorções nos discursos públicos e na mídia (Walter et al., 2020).
Já o debunking, ocorre quando se exibe uma mensagem já corrigida que explícitamente demonstra que a mensagem original estava incorreta (Chan et al., 2017), esse processo de correção envolve a identificação de afirmações enganosas e a apresentação de evidências para desacreditá-las, mas é importante salientar que, conforme Lewandowski et al. (2012, 2020) para que essa correção seja realmente efetiva, deve-se utilizar abordagens de correção bem estruturadas e completas como por exemplo, uma refutação bem detalhada, com a explicação clara e compreensivelmente factível. Durante a pandemia de COVID-19, houve um aumento significativo da atividade de organizações de checagem de fatos que também promoviam o debunking como forma de desmistificação de fatos (Siwakoti et al., 2021). Ou seja, trata-se de recursos que buscam combater a desinformação no Brasil e no mundo e que já possuem evidências quanto a sua eficácia. Por exemplo, nos estudos conduzidos por Chan et al. (2017) e Ecker et al. (2020) foi identificado o efeito positivo da aplicação desse tipo de técnica de checagem e correção de fatos, além do seu impacto social.
No entanto, alguns autores (Fernandes et al., 2023) apontam que apesar da ampla aderência dessas técnicas, já existe um conhecimento de suas limitações e insuficiências de sua aplicação de forma isolada. Ao longo dos anos surgiu a necessidade de aprimoramento dessa checagem de fatos devido a influência de fatores como a diminuição de exclusividade dos meios de comunicação numa função detentora do monopólio do debate público, e a recorrente necessidade da verificação de veracidade em campanhas políticas (Kneipp et al., 2020). Ademais, como demonstrado por Siwakoti et al. (2021), a pandemia de COVID-19 forçou a evolução do saber científico em relação a essas técnicas de correção. Desse modo, tanto o debunking quanto fact-checking, ainda que com resultados satisfatórios, isoladamente não conseguem acompanhar o crescimento exponencial da propagação de notícias falsas (Pennycook & Rand, 2021). Como exemplo tem-se a implementação de bots para a divulgação massiva de informações infundadas que ocorreu durante a pandemia de COVID-19, indicando como pode ser desafiador em termos logísticos, a desmistificação dessas informações em tempo real.
Contudo, nota-se que é de suma importância a avaliação da eficácia das estratégias de debunking e fact-checking na redução da disseminação de desinformação, bem como para integrar perspectivas e oferecer uma visão mais abrangente frente a essa problemática. Para tanto, não foram encontrados estudos científicos de revisão que reunissem e descrevessem sobre a utilização dessas técnicas no combate à desinformação, os quais poderiam contribuir para informar e aprimorar as práticas existentes e direcionar futuras investigações. Assim, com o intuito de suprimir as lacunas supracitadas, o presente estudo procurou investigar, por meio de uma revisão integrativa da literatura, o uso das técnicas de debunking e fact-checking como estratégias de combate às notícias falsas no mundo. Ao fornecer uma visão abrangente e crítica do estado atual de pesquisas nesse campo, pode-se contribuir para um ambiente de informação mais confiável, democrático e eficiente.
Materiais e método
Trata-se de uma revisão integrativa da literatura que teve como objetivo utilizar métodos sistemáticos para selecionar e analisar os dados coletados, seguindo as diretrizes do PRISMA (Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses). Para tanto, a pergunta que norteou a presente revisão foi: “Como a aplicação de técnicas de debunking e fact-checking são utilizadas no combate de notícias falsas no mundo?”.
Estratégia de busca
As estratégias de busca incluíram os seguintes termos utilizados isoladamente ou combinados: “debunking”, “fact-checking”, “fake news”, “notícias falsas”. As combinações realizadas foram: [“debunking”; “fact-checking”], [“debunking”; “fake news”] e [“debunking”; notícias falsas]. A busca foi realizada nas bases de dados SAGE, Science Direct e Periódicos Capes, no mês de outubro de 2023. O passo a passo da busca e da seleção dos artigos encontrados pode ser visualizado no fluxograma da Figura 1.
Critérios de inclusão e exclusão
Foram incluídos estudos que abordaram a aplicação de técnicas de debunking e/ou fact-checking no combate de notícias falsas em todo o mundo, publicados nos idiomas inglês ou português do Brasil, entre os anos de 2020 a 2024. Por outro lado, foram excluídos estudos que não se referiam ao tema proposto, artigos de revisão, teóricos, capítulos de livro, dissertações e teses, ou ainda que fossem editoriais, cartas, banco de dados e opiniões.
Avaliação da qualidade da metodologia dos estudos
A qualidade metodológica dos estudos selecionados foi avaliada a partir do checklist adaptado de García-Llana et al. (2014), o qual é composto por 12 critérios avaliativos distribuídos em quatro dimensões: (1) seleção e desenho de pesquisa; (2) definição e mensuração das variáveis estudadas; (3) método e análise de dados; e (4) qualidade dos resultados e discussão. A avaliação foi realizada em conjunto por dois pesquisadores, e em caso de divergência um terceiro pesquisador experiente realizou a avaliação. Após a avaliação, cada estudo foi classificado quanto à sua qualidade geral em ‘baixa’ (1-4 pontos), ‘média’ (5-8 pontos) ou ‘alta’ (9-12 pontos).
Figura 1 - Fluxograma da estratégia de busca da presente revisão
Fonte: Elaboração própria
Extração de dados
Após a seleção final dos artigos, foram extraídos e tabulados em uma planilha do Excel as seguintes informações: Autor e Ano, Objetivo do estudo, Tipo de estudo, Tamanho amostral, Características dos participantes, País de origem, Tipo de técnica utilizada (debunking e/ou fact-checking) e principais resultados encontrados. Uma análise descritiva desses tópicos foi realizada, com exceção do tópico ‘Principais resultados’, o qual foi analisado qualitativamente por meio de categorias, considerando o tipo de técnica utilizada nos estudos. Assim, três categorias foram definidas, a saber: artigos se valeram apenas de (1) técnicas de debunking; (2) de técnicas de fact-checking; e (3) que utilizaram mais de uma técnica, sendo que uma delas (debunking e fact-checking) deveria estar inclusa.
Resultados e Discussão
A estratégia de busca identificou um total de 300 publicações nas bases de dados SAGE, Science Direct e Periódicos Capes. Desses estudos encontrados, 102 foram removidos por serem duplicados, 1 foi removido por ser vídeo e 1 foi removido por ser um banco de dados, totalizando 104 artigos excluídos antes da triagem. Dos 196 artigos restantes, 143 foram excluídos por não atenderem aos critérios de inclusão considerando os títulos (n = 143) e os resumos (n = 1). Em seguida, os 52 artigos restantes foram lidos na íntegra, e 41 foram excluídos por estarem dentro dos critérios de exclusão definidos. Por fim, 11 artigos foram elegíveis para a presente revisão, conforme mostrado na Figura 1.
Qualidade metodológica
De acordo com os critérios avaliados (García-Llana et al., 2014), todos os estudos (100%; n = 11) foram classificados como de alta qualidade, com pontuação variando entre 10 e 12 pontos. Assim, nenhum dos estudos selecionados foram de média e baixa qualidade e qualidade metodológica. Na Tabela 1 é possível verificar esses resultados.
Tabela 1 - Qualidade Metodológica dos 12 artigos revisados.
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1 |
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3 |
4 |
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6 |
7 |
8 |
9 |
10 |
11 |
12 |
Total |
Qualidade |
Hameleers; Meer, 2019 |
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11 |
Alta |
Ecker et al., 2020 |
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12 |
Alta |
Ecker et al., 2020 |
+ |
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+ |
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+ |
+ |
+ |
- |
11 |
Alta |
Yousuf et al., 2021 |
+ |
+ |
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+ |
+ |
+ |
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+ |
12 |
Alta |
Martel et al., 2021 |
+ |
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+ |
- |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
- |
10 |
Alta |
Brashier et al., 2021 |
+ |
+ |
+ |
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- |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
11 |
Alta |
Xiao, 2022 |
+ |
+ |
+ |
+ |
- |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
- |
10 |
Alta |
Pasquetto et al., 2022 |
+ |
+ |
+ |
+ |
- |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
- |
10 |
Alta |
Tay et al., 2022 |
+ |
+ |
+ |
+ |
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+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
12 |
Alta |
DeVerna et al., 2023 |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
12 |
Alta |
Bachmann e Valenzuela, 2023 |
+ |
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+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
+ |
12 |
Alta |
Notas: Critérios avaliados - Seleção e desenho de pesquisa: 1- Os critérios de inclusão e de exclusão dos participantes são indicados; 2- O método de especificação da amostra é especificado; 3- O desenho da pesquisa é claramente especificado no texto; 4- O número de participantes potencialmente elegíveis e/ou aqueles inicialmente selecionados e/ou aqueles que aceitam e/ou aqueles que finalmente participam ou respondem é relatado; 5- Se grupos foram comparados, a informação do ponto 4 é indicada para cada grupo. Definição e mensuração das variáveis estudadas: 6- As variáveis estão claramente definidas; 7- Instrumentos validados são utilizados para todas as principais variáveis estudadas. Método e análise de dados: 8- As amostras avaliadas são iguais ou superiores a 30 participantes; 9- Os testes estatísticos utilizados são especificados; 10- A perda de participantes e/ou dados perdidos foram corretamente tratados (ou pelo menos indicado no texto que a qualidade dos dados foi revisada antes da análise estatística). Qualidade dos resultados e discussão: 11- Os resultados são claramente descritos de acordo com os objetivos do estudo; 12- A discussão considera as recompensas práticas dos resultados e benefícios potenciais para os participantes. Classificação da Qualidade Metodológica: Baixa (0-4 pontos), Média (5-8 pontos) e Alta (9-12 pontos). Fonte: adaptado pelos autores a partir de (García-Llana et al., 2014).
Análise das características dos estudos selecionados
Na Tabela 2 estão resumidas as características dos estudos selecionados, quanto a: autor e ano, objetivo do estudo, tipo de estudo, tamanho amostral, idade dos participantes, país de origem, tipo de técnica utilizada (debunking e/ou fact-checking). Em seguida são apresentadas as análises descritivas deste tópico.
Tabela 2: Resumo das características dos 11 artigos selecionados
Autor (ano) |
Objetivos |
Tipo de estudo |
Tamanho amostral |
Idade dos participantes |
País de origem |
Técnica(s) utilizada |
Ensaio quase-experimental |
Avaliar como a exposição seletiva a refutações de posturas congruentes e incongruentes de desinformação (ou seja, verificadores de fatos) afeta o acordo dos cidadãos com afirmações feitas em notícias sobre imigração e mudança climática. |
|
1.117 |
Média = 37 anos
|
Holanda |
debunking e fact-checking |
Verificar se o fact-checking poderia causar adesão à informação falsa, no cenário onde a informação falsa ainda não era conhecida pela pessoa. |
Ensaio quase-experimental |
1.718 |
20 a 81 anos
|
Austrália |
fact-checking |
|
Ecker et al. (2020b) |
Testar a possibilidade de haver diferença na resistência a correções de visão de mundo, caso uma informação complexa seja apresentada no formato narrativo ou não-narrativo.
|
Ensaio quase-experimental |
2.279 |
18 a 89 anos
|
Austrália |
debunking |
Yousuf et al. (2021) |
Delinear um caminho da exposição à desinformação para comportamentos de anti-desinformação, parcialmente mediados por percepções equivocadas no contexto da COVID-19. |
Ensaio Randomizado Controlado |
2.158 |
60+ anos
|
Holanda |
debunking |
Martel et al. (2021) |
Investigar como a força (explícita/objetiva) e o tipo de correção à desinformação afeta a eficácia da correção em si. |
Ensaio quase-experimental |
2.228 |
Média = 44,84 anos
|
Estados Unidos |
debunking |
Brashier et al. (2021) |
Testar o quanto o tempo que se leva para corrigir uma notícia falsa é importante. |
Ensaio quase-experimental |
2.683 |
- |
Estados Unidos |
debunking e prebunking |
Xiao (2022) |
Propor um método mais preciso de medição da desinformação para traçar uma rota causal entre a exposição à desinformação e os comportamentos contra desinformação, tendo como mediador as percepções erradas no contexto da COVID-19. |
Ensaio quase-experimental |
410 |
18 a 75 anos
|
China |
debunking |
Pasquetto et al. (2022) |
Mostrar como o WhatsApp pode desempenhar um papel importante na correção da desinformação, e como recursos específicos do WhatsApp podem ser aproveitados para maximizar o recompartilhamento de mensagens de debunking. |
Ensaio Randomizado Controlado |
1.372 |
20 a 70 anos
|
Índia |
debunking |
Tay et al. (2022) |
O objetivo deste estudo foi investigar três questões: prebunking ou debunking é mais eficaz na redução dos impactos da desinformação?; A desinformação implícita ou explícita é mais difícil de corrigir?; Os efeitos da desinformação e das melhores práticas nas medidas de cognição se estenderão às medidas de comportamento? |
Ensaio quase-experimental |
735 |
- |
Austrália |
debunking e prebunking |
DeVerna et al. (2023) |
Investigar o impacto das verificações de factos gerados por um modelo popular de inteligencia artificial na crença e intenção de partilha de notícias políticas. |
Ensaio quase-experimental |
1.548 |
18 a 65+ anos |
Estados Unidos |
fact-checking |
Bachmann & Valenzuela (2023) |
Examinar se a exposição à verificação de fatos nas mídias sociais pode influenciar as avaliações das pessoas sobre a mídia de notícias e seu conteúdo. |
Ensaio quase-experimental |
1.472 |
- |
Chile |
fact-checking |
Fonte: Elaboração própria
Quanto ao ano de publicação, dos 11 estudos selecionados, 27,3% (n = 3; Ecker et al., 2020a; Ecker et al., 2020b; Hameleers & Meer, 2020) foram publicados no ano de 2020, assim como no ano de 2021 (27,3%; n = 3; Yousuf et al., 2021; Martel et al., 2021; Brashier et al., 2021) e no ano de 2022 (27,3%; n = 3; Xiao, 2022; Pasquetto et al., 2022; Tay et al., 2022). Além de 18,1% dos estudos que foram publicados no ano de 2023 (n = 2; DeVerna et al., 2023; Bachmann & Valenzuela, 2023). Nota-se, portanto, que o número de publicação se manteve relativamente estável, indicando o interesse pela temática desde o ano da pandemia de COVID-19 até 2023. Sobre isso, vale mencionar que entre 2016 e 2021 o número de organizações de checagem de fatos no mundo dobrou, chegando a quase 400 entidades divididas entre 108 países (Stencel et al. 2021), aumento este que foi potencializado também em decorrência da Infodemia (Suárez, 2020; Siwakoti et al. 2021), refletindo-se nas publicações acerca do tema.
Observou-se ainda o interesse mundial pela temática, uma vez que os 11 estudos foram realizados em países de quase todos os continentes, sendo os artigos, portanto, dos seguintes países: Estados Unidos (n = 3; Martel et al., 2021; Brashier et al., 2021; DeVerna et al., 2023), Austrália (n = 3; Ecker et al., 2020a; Ecker et al., 2020b; Tay et al., 2022), Holanda (n = 32; Hameleers & Van der Meer, 2020; Yousuf et al., 2021), Chile (n = 1; Bachmann e Valenzuela, 2023), China (n = 1; Xiao, 2022), e Índia (n = 1; Pasquetto et al., 2022). Sobre isso, pesquisas já vêm demonstrando justamente a disseminação e o crescimento do movimento global de verificação de factos (Graves & Lauer, 2020), refletindo no âmbito da pesquisa acadêmica e científica.
Quanto ao tipo de estudo, nota-se que a maioria (n = 9) dos artigos selecionados (Bachmann & Valenzuela, 2023; DeVerna et al., 2023; Tay et al., 2022; Xiao, 2022; Brashier et al., 2021; Martel et al., 2021; Ecker et al., 2020a; Ecker et al., 2020; Hameleers & Van der Meer, 2020) trata-se de ensaios quase-experimentais, sendo os demais (Pasquetto et al., 2022; Yousuf et al., 2021; n = 2) ensaios randomizados controlados.
Em relação ao tamanho amostral obteve-se uma amostra total de 17.720 participantes, com média de 1.548 (DP = 694) participantes por estudo. O estudo com maior tamanho amostral foi o conduzido por Brashier et al. (2021; n = 2.683) e o de menor, o realizado por Xiao (2022; n = 410).
Quanto à idade dos participantes, observou-se um alcance que variou de 18 a 89 anos. Nenhum estudo trouxe restrições quanto a faixa de idade dos participantes, a não ser de terem mais de 18 anos. Ressalta-se que três estudos (Brashier et al., 2021; Tay et al., 2022; Bachmann & Valenzuela, 2023) não forneceram características amostrais de idade dos participantes.
Quanto ao tipo de técnica utilizada (debunking e/ou fact-checking), observou-se que cinco dos estudos selecionados (Ecker et al., 2020b; Yousuf et al., 2021; Martel et al., 2021; Xiao, 2022; Pasquetto et al., 2022) se valeram apenas de técnicas de debunking, três utilizaram apenas a técnica de fact-checking (Ecker et al., 2020a; DeVerna et al., 2023; Bachmann & Valenzuela, 2023), enquanto que os demais (n = 3) utilizaram mais de uma técnica. Isto é, o estudo de Hameleers e Van der Meer (2020; n = 1) testaram ambas as técnicas de forma comparativa; já os estudos conduzidos por Brashier et al. (2021) e por Tay et al. (2022) empregaram o uso do debunking juntamente com prebunking, o qual trata-se de um método subsequente ao debunking baseado na teoria da Inoculação Psicológica (Pennycook & Rand, 2021).
Categoria 1: Debunking
Cinco dos artigos selecionados utilizaram a técnica do debunking em seus estudos (Ecker et al., 2020b; Martel et al., 2021; Pasquetto et al., 2022; Xiao, 2022; Yousuf et al., 2021). A análise aqui descrita buscou verificar como a técnica foi utilizada no combate à desinformação e seus efeitos.
O estudo realizado por Yousuf et al. (2021) buscou delinear um caminho da exposição à desinformação para comportamentos anti-desinformação, parcialmente mediados por percepções equivocadas no contexto da COVID-19. Sabe-se que no contexto da COVID-19, informações falsas sobre a vacina eram consideravelmente influentes na resistência à vacinação, o que se tornou um problema principalmente para grupos de risco como idosos. Assim, o estudo testou (em pessoas idosas) se a adição de debunking contra mitos envolvendo a vacina a um vídeo que continha outras informações sobre vacinação, reduziria a hesitação à mesma. Como principal resultado, o estudo encontrou evidências de que a adição de estratégias de debunking aumenta a rejeição a informações falsas sobre a vacinação.
Ainda no contexto da COVID-19, Xiao (2022) propôs em seu estudo um método mais preciso de medição da desinformação para traçar uma rota causal entre a exposição à desinformação e comportamentos anti-desinformação, tendo como mediador as percepções erradas no contexto da COVID-19. O estudo investigou as relações diretas e indiretas entre exposição à desinformação, dados demográficos e intenções de comportamento anti-desinformação e propôs como elemento mediador as percepções erradas (quando a crença da pessoa sobre um tema não é apoiada por evidências claras ou opiniões de especialistas). Os resultados mostraram que a exposição frequente à desinformação por meio das mídias sociais, a idade avançada e a ideologia liberal estão associadas a maiores intenções de verificar a veracidade das informações. A exposição à desinformação por meio das mídias sociais também esteve associada a menos percepções erradas relacionadas à COVID-19. No entanto, os resultados alertam que a exposição à desinformação por meio de mídias de notícias on-line e contatos pessoais, orientação política conservadora, identidades de minorias étnicas e percepções erradas podem inibir comportamentos positivos no combate à desinformação.
Por outro lado, Pasquetto et al. (2022) verificaram que os usuários do WhatsApp têm maior probabilidade de compartilhar novamente mensagens de debunking quando as recebem de pessoas próximas ou de membros do grupo com os quais geralmente concordam politicamente, ou quando a pessoa faz parte dessas duas categorias ao mesmo tempo. Além disso, notou-se que os usuários têm preferência por mensagens de áudio em relação a outros formatos como texto ou imagens. Com os dados obtidos, a pesquisa indicou o quanto o WhatsApp desempenha um papel importante na correção da desinformação e como recursos específicos do WhatsApp podem ser aproveitados para maximizar o recompartilhamento de mensagens de debunking.
O estudo de Martel et al. (2021), por sua vez, objetivou investigar a eficácia de mensagens corretivas quanto a sua força, ou seja, se havia maior relevância entre uma mensagem explícita ou não, além do grau de detalhe desta mensagem. Por meio de um questionário online e com uma amostra de 2.228 participantes, Martel et al. (2021) observaram que, de forma contrária à maioria das suas hipóteses formuladas, a força da mensagem corretiva e também a sua profundidade explicativa não afetou significativamente os níveis de engajamento com a mensagem em si. Isto é, mensagens explícitas ou implícitas, simples e detalhadas não apresentaram diferença considerável em relação ao engajamento dos participantes. Por conseguinte, a essas circunstâncias, encontrou-se também que o nível de pensamento analítico esteve relacionado com a aceitação da mensagem corrigida, onde quanto maior o nível de pensamento analítico, maior a aceitação, independentemente do tipo da mensagem.
Por fim, e considerando que a desinformação possui um efeito contínuo na memória e raciocínio inferencial dos indivíduos até mesmo após a correção ser apresentada, um fator que ainda não tinha sido investigado era a diferença de eficácia entre correções que seguem o modelo narrativo e o não-narrativo. Assim, o estudo conduzido por Ecker et al. (2020b), verificou se haveria diferença entre estes dois modelos, onde o formato não narrativo possui um estilo de mensagem abstrato, baseado na lógica e descontextualizado (se comparado ao modelo narrativo), e tendem a evocar processamento analítico. Enquanto que o modelo narrativo seguiu um formato de história, o qual foram definidas pela sua cronologia e causalidade, descrevendo personagens buscando objetivos ao longo do tempo, podendo apresentar as emoções e pensamentos do personagem (Ecker et al., 2020b).
Os resultados do estudo foram bastante conclusivos: embora as correções tenham causado uma mudança considerável nas crenças, essa mudança foi apenas levemente reduzida após um atraso de 2 dias, e não houve distinção entre as condições narrativas e não narrativas. Ao examinar as crenças em mitos através de perguntas de inferência pós-correção mais indiretas, também houve poucas evidências de benefício da narrativa: embora o efeito principal da condição tenha sido ligeiramente significativo na análise geral, as diferenças fundamentais entre as condições narrativas e não narrativas em cada atraso não foram estatisticamente significativas. Ademais, as análises bayesianas consistentemente apoiaram a hipótese nula de que não há distinção entre as condições narrativas e não narrativas (Ecker et al., 2020b).
Desse modo, nota-se que o uso da técnica de debunking nos estudos selecionados ocorreram em diferentes contextos e com diferentes amostras. Alguns resultados indicaram dados relevantes que otimizam o uso da técnica, enquanto que outros não indicaram evidências nas especificidades investigadas. Assim pontua-se que a eficácia do debunking parece depender de fatores como o meio de disseminação da informação, o formato das mensagens corretivas, e o perfil demográfico e ideológico dos indivíduos; embora alguns estudos tenham demonstrado que mensagens corretivas explícitas e detalhadas não necessariamente aumentam o engajamento ou aceitação, outros destacaram a importância de considerar o pensamento analítico e a forma de apresentação das correções. Em suma, apesar das variações nos achados, a técnica de debunking mostra-se uma ferramenta valiosa no combate à desinformação, com potencial de melhoramento e adaptação para diferentes plataformas e públicos.
Categoria 2: Fact-checking
A segunda categoria englobou três estudos que utilizaram a técnica do fact-checking em seus estudos (Ecker et al. 2020a; DeVerna et al., 2023; Bachmann & Valenzuela, 2023). A análise visou demonstrar como essa técnica tem sido utilizada no combate à desinformação.
Com base nos achados encontrados por Bachmann e Valenzuela (2023), notou-se que a aplicação da técnica de fact-checking, juntamente à correção de desinformações, as crenças do indivíduo tornam-se mais precisas. Outro elemento que está atrelado à verificação de fatos é a inclusão de recursos visuais e transparentes que podem facilitar a correção de desinformações, ocasionando comportamentos que, consequentemente, disseminam notícias já corrigidas. Em geral, verificar fatos ocasiona uma redução efetiva nas percepções errôneas do indivíduo, como diminui a super confiança nas notícias e ocasiona uma criticidade diante destas (Bachmann & Valenzuela, 2023).
Entretanto, no contexto de correção de notícias falsas, um fenômeno que tem sido investigado é o “back-fire effect” que segundo Swire‐Thompson et al., (2020), refere-se a quando uma correção leva um indivíduo a aumentar sua crença no próprio equívoco que a correção pretendia corrigir. Em outras palavras, é quando, ao expor o sujeito à informação falsa seguida juntamente com a correção, o efeito obtido é a adesão do sujeito à informação em vez de entendê-la como uma notícia falsa. Este fenômeno torna-se relevante uma vez que a intenção das técnicas de debunking e fact-check visam reduzir a adesão a notícias falsas e não a aumentar. A partir da ideia de que o back-fire effect seria uma consequência possível, o estudo australiano conduzido por Ecker et al. (2020a) investigou se a emissão de uma informação falsa desconhecida no momento de sua correção poderia causar um efeito contrário ao desejado e criar uma adesão à informação falsa. No total, três experimentos foram realizados, onde apenas um deles forneceu evidência fraca, enquanto os outros 2 forneceram evidências substanciais contra a hipótese de que o fenômeno ocorreria (Ecker et al. 2020a). Apesar do primeiro experimento ter encontrado pequenos indícios de back-fire effect, os experimentos subsequentes forneceram evidências substanciais contra sua ocorrência do back-fire effect mesmo sob condições que deveriam aumentar a familiaridade, como a adição de uma nova informação que maximiza a confiança na mensagem anterior e também o acréscimo de um intervalo de retenção mais longo (3 semanas).
Já DeVerna et al. (2023), investigaram o impacto das verificações de factos gerados por um modelo popular de IA na crença e intenção de partilha de notícias políticas. Os resultados da pesquisa indicaram que a crença média e o discernimento de compartilhamento dos participantes não foram afetados pela visualização de informações de verificação de fatos de Inteligência Artificial (IA), independentemente de tais informações serem ou não opcionais. No geral, notou-se que as verificações de fatos geradas por IA podem afetar a crença e a intenção de compartilhar manchetes de notícias. Além disso, o verificador de fatos de IA foi compreendido como sendo prejudicial em casos específicos, pois diminui as crenças em manchetes verdadeiras que são rotuladas erroneamente como falsas e aumenta as crenças em manchetes falsas sobre as quais não se tem certeza. Quando os participantes tiveram a opção de ver verificações de fatos de IA e optaram por fazê-lo, eles foram significativamente mais propensos a compartilhar tanto notícias verdadeiras quanto falsas, mas foram mais propensos a acreditar em notícias falsas (DeVerna et al., 2023).
Em síntese, a técnica de fact-checking tem se revelado uma ferramenta essencial no combate à desinformação, promovendo uma maior precisão nas crenças individuais e fomentando uma postura crítica diante das notícias consumidas. Contudo, a eficácia do fact-checking pode ser mitigada por fenômenos como o back-fire effect, embora as evidências indiquem que sua ocorrência seja pouco frequente e necessitem de mais estudos para corroborar esses achados. Adicionalmente, a utilização de inteligência artificial na verificação de fatos apresenta tanto potencial quanto desafios, podendo impactar negativamente a credibilidade de notícias verídicas e intensificar a crença em informações falsas. Basicamente, enquanto o fact-checking se configura como uma estratégia crucial para a redução de percepções errôneas, é recomendado continuar explorando e refinando essas abordagens para maximizar sua eficácia e mitigar possíveis efeitos adversos.
Categoria 3: Debunking e Fact-checking e/ou dois ou mais tipos de técnicas
Por fim, a terceira e última categoria incluiu os três últimos estudos, os quais se utilizaram das técnicas de debunking e fact-checking e/ou dois ou mais tipos de técnicas (Brashier et al., 2021; Hameleers & Van der Meer, 2020; Tay et al., 2022).
No estudo realizado por Brashier et al. (2021), os autores testaram o quanto o tempo que se leva para corrigir uma notícia falsa é importante, isto é, testaram a eficácia de prebunking e debunking uma semana depois da intervenção. É indispensável aqui destacar, que prebunking é uma técnica recente que se baseia na teoria da inoculação psicológica, podendo ser explicada a partir de uma metáfora comum nesse campo, a qual se refere à esta técnica como sendo uma “vacina contra a desinformação”. Para tanto ela é empregada como forma de prevenção, apresentando ao indivíduo detalhes e táticas de construção de uma notícia falsa. Até então, nenhum estudo havia ainda comparado a eficácia dessas técnicas de correções de informações falsas depois que elas eram aplicadas, ou seja, considerando o fator temporal. Os resultados mostraram que a desmistificação imediata da notícia falsa após ser exibida foi crucial, pois aumentou, significativamente, a classificação dessa notícia como sendo falsa após uma semana. A desmistificação foi mais eficaz do que a rotulagem da notícia como simplesmente sendo falsa ou verdadeira, além disso a desmistificação pós-exposição foi essencial devido ao efeito de influência contínua (Brashier et al., 2021). Ressalta-se que tornar as correções memoráveis é um desafio.
No contexto midiático, em especial quando a política é uma das variáveis, há um déficit na veracidade de informações transmitidas. A partir disso, os estudos de Hameleers et al. (2020) buscaram investigar os efeitos da desinformação política, realizando dois experimentos (n = 1.117), expondo notícias políticas atitudinais congruentes ou incongruentes, ou seja, que estão ou não de acordo com as crenças dos indivíduos. Como resultados, utilizando a técnica de fact-checking, os autores evidenciaram que os indivíduos diminuem a concordância com a desinformação ao passo que esta não esteja de acordo com a sua crença, ou seja, atitude congruente.
Além disso, é importante ressaltar que esses achados dispõem de que, embora o indivíduo consiga selecionar os verificadores de fatos, a seleção é a priori realizada caso esteja de acordo com as suas atitudes, ou seja, há uma identificação do conteúdo que possa vir a desmascarar a informação, porém não é escolhido devido a não consonância com a atitude do sujeito. Ressalta-se que os participantes do estudo foram norte-americanos, sendo selecionados por gênero, idade, escolaridade e partidarismo, o que reflete nos resultados do estudo. Especificamente, no quesito partidarismo, o estudo mostra que os indivíduos selecionam verificadores de fatos se estes vierem a refutar alguma notícia que está dissonante ao que ele acredita. Hameleers et al. (2020) propõem que a variável maior escolaridade faz com que o indivíduo esteja mais propenso a selecionar verificadores de fatos.
Outros resultados importantes estão relacionados ao fato de que os verificadores de fatos apenas são significativos se a notícia original for congruente com as atitudes do indivíduo. Ou seja, se a notícia não estiver diante de um padrão que o indivíduo julgue consoante às suas crenças, não há possibilidades de verificação daquela notícia (Hameleers et al., 2020).
Na tentativa de preencher as lacunas das pesquisas que deram foco na desinformação explícita falsa, sendo que desinformações implícitas também usufruem de informações verdadeiras para enganar os interlocutores, o estudo de Tay et al. (2022), por intermédio da técnica de debunking, buscou compreender se a informação implícita ou explícita é mais difícil de corrigir e, outra questão ainda não abordada, se o efeito da desinformação se estende da cognição ao comportamento, na tentativa de eliciar, através de desinformações, o comportamento consumidor dos indivíduos em relação aos produtos do comércio. Como resultados, os dois tipos de desinformação aumentaram a confiança dos participantes na desinformação ao responderem ao questionário. Não somente isso, tanto o prebunking quanto o debunking foram capazes de reduzir a dependência da desinformação, embora o debunking tenha se mostrado mais eficaz na neutralização da desinformação.
Em suma, os resultados sugerem que os indivíduos, em média, confiam mais na desinformação explícita do que na desinformação implícita, mesmo que a dificuldade de corrigir ambos os tipos de desinformação não seja estatisticamente diferente. No que tange ao comportamento de influenciar o consumo, apenas a desinformação explícita impactou de forma confiável a disposição de pagar, não havendo disposição de buscar informações adicionais sobre o produto (Tay et al., 2022).
Considerações Finais
Ao tentarmos investigar na literatura o uso das técnicas de debunking e fact-checking como estratégias de combate às notícias falsas no mundo, percebemos que diversas variáveis estão correlacionadas. Para usá-las, é necessário compreender em qual cenário e em quais indivíduos elas serão aplicadas. Embora os estudos selecionados e analisados tenham considerado as redes sociais ou a mídia como um meio de transmissão de informações, cada conteúdo deve ser desmistificado para obter uma melhor visualização de como usar a verificação de fatos nestes. Em linhas gerais, o uso das técnicas proporcionou uma melhor percepção dos indivíduos em relação às notícias que estes entravam em contato. Além disso, embora as crenças sejam fatores que impulsionam os indivíduos a disseminar informações que estão de acordo ao que eles acreditam, quando contrário, tendem a desmascará-las, gerando uma contribuição ao combate às desinformações.
O fornecimento de uma visão ampla e a instauração da criticidade acerca da necessidade de combater informações falsas é necessário, visto que, para além do campo de pesquisa, os indivíduos que usufruem do conhecimento técnico e teórico podem disseminá-los a fim de contribuir para que as informações, cada vez mais venha a ser mais confiáveis. Ademais, disseminar o conhecimento científico é torná-lo democrático.
A desinformação, embora concentrada no ambiente das mídias sociais, encontra-se presente cotidianamente em outros meios de comunicação. Deve-se considerar que, embora tentemos evidenciar a eficácia de diversas técnicas para o combate à desinformação, é necessário que saibamos como usá-las, reconhecendo a idiossincrasia das condições que permeiam a sociedade, podendo adaptá-las e trazendo efeitos significativos. Um exemplo disso foi a luta contra a desinformação que viralizava online, tornando-se foco secundário da maioria das instituições de fact-checking no mundo (Graves & Lauer, 2020) e, com o alarme da Infodemia de desinformação sobre a COVID-19 disseminada pela Internet, o mundo do jornalismo manteve a primazia dos seus esforços para este tema (Suárez, 2020).
Em suma, os principais resultados nos mostram que as técnicas de fact-checking e debunking podem ser usadas em diferentes meios de comunicação, como no WhatsApp, por exemplo, que permite o compartilhamento instantâneo e imediato de mensagens, considerando que a proximidade entre o interlocutor e o receptor pode gerar um maior compartilhamento das mensagens, como também o nível de descrição que a mensagem traz neste meio, sendo ela com um maior detalhamento ou não, de forma implícita ou explícita. Isso nos permite perceber que os mecanismos por trás são comuns e costumam se repetir na forma de disseminação dessas informações. Outras variáveis consideradas nos estudos foram, por exemplo, gênero, idade, partidarismo, escolaridade, proximidade entre quem recebe e quem envia a mensagem, crenças e importância do indivíduo (ser leigo ou ser especialista), devendo outras serem investigadas para maior compreensão do fenômeno.
No entanto, este estudo apresenta algumas limitações. Primeiramente, a generalização dos resultados é restrita, uma vez que os estudos analisados não contemplam todas as bases de dados científicas existentes sobre o tema, e podem não refletir a diversidade de contextos culturais e midiáticos. Além disso, a rápida evolução das tecnologias de verificação de fatos e das estratégias de desinformação requer uma avaliação contínua e atualizada para compreender plenamente suas implicações. Futuras pesquisas devem considerar esses aspectos, explorando novas metodologias e ampliando a abrangência geográfica e cultural das amostras para fortalecer a validade e a aplicabilidade das conclusões.
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[1] Licenciatura en Psicología, Universidad Tiradentes, Grupo de Investigación en Psicología del Desarrollo, Salud y Procesos Psicológicos, Aracaju, Brasil, Correo electrónico: caue.elias@souunit.com.br, https://orcid.org/0009-0007-8328-4019, Porcentaje de autoría: 25%.
[2] Licenciatura en Psicología, Universidad Tiradentes, Grupo de Investigación en Psicología del Desarrollo, Salud y Procesos Psicológicos, Aracaju, Brasil, Correo electrónico: david.tavares@souunit.com.br, https://orcid.org/0009-0007-5311-8896, Porcentaje de autoría: 25%.
[3] Licenciatura en Psicología, Universidad Tiradentes, Grupo de Investigación en Psicología del Desarrollo, Salud y Procesos Psicológicos, Aracaju, Brasil, Correo electrónico: gabriel.lsantana@souunit.com.br, https://orcid.org/0009-0002-7438-1347, Porcentaje de autoría: 25%.
[4] Doctorado en Psicología, Universidad Tiradentes, Grupo de Investigación en Psicología del Desarrollo, Salud y Procesos Psicológicos, Aracaju, Brasil, Correo electrónico: ariane.kluge@souunti.com.br, https://orcid.org/0000-0001-8815-6998, Porcentaje de autoría: 25%.